Novos Títulos Executivos Extrajudiciais: Dispensa de Testemunhas pelo uso de Assinatura Digital
No último dia 14, entrou em vigor a Lei Federal nº 14.620/2023, que implementou alterações em diversas normas materiais e, no âmbito processual, ampliou o rol de títulos executivos extrajudiciais.
A novel legislação incluiu o § 4º à redação do artigo 784 do Código de Processo Civil para determinar que “[n]os títulos executivos constituídos ou atestados por meio eletrônico, é admitida qualquer modalidade de assinatura eletrônica prevista em lei, dispensada a assinatura de testemunhas quando sua integridade for conferida por provedor de assinatura.”
A alteração legislativa está em consonância com a motivação da legislação processual de 2015, em especial ao princípio da eficiência. Converge, ainda, com a jurisprudência que vinha se consolidando no Superior Tribunal de Justiça, no sentido de reconhecer que a assinatura digital de contrato eletrônico, por meio de terceiro desinteressado (a autoridade certificadora), é hábil a certificar que determinado usuário de certa assinatura a utilizou e firmou o documento eletrônico, possibilitando a verificação de autenticidade e presencialidade do contratante e, assim, o reconhecimento da executividade dos contratos eletrônicos[1].
A leitura do novo dispositivo deve ser interpretada à luz das normas vigentes quanto à validade e às modalidades de assinatura eletrônica admitidas em âmbito nacional, em especial à Medida Provisória nº 2.200-2/2001, que instituiu a Infraestrutura de Chaves Públicas Brasileira (ICP-Brasil), e à Lei nº 14.063/20, que regulamentou o uso de assinaturas eletrônicas em interações com entes públicos e em atos de pessoas jurídicas em diferentes níveis de confiança.
Por meio das referidas normas e, especialmente, à luz do artigo 4º da Lei nº 14.063/20, foram reconhecidas três formas de assinatura eletrônica, a saber: (i) a simples, a qual somente permite identificar o seu signatário ou, ainda, anexa ou associa seus dados a outros dados em formato eletrônico do signatário; (ii) a avançada, a qual utiliza certificados não emitidos pela ICP-Brasil ou outros meios de comprovação da autoria e da integridade de documentos eletrônicos, desde que admitido pelas partes como válido ou aceito pela pessoa a quem for oposto o documento e, cumulativamente, (ii.1) esteja associada ao signatário de maneira unívoca, (ii.2) utilize dados para a criação de assinatura eletrônica cujo signatário pode, com elevado nível de confiança, operar sob o seu controle exclusivo; e (ii.3) esteja relacionada aos dados a ela associados de tal modo que qualquer modificação posterior seja detectável; e, por fim, (iii) a qualificada, emitida por meio do uso de certificados ICP-Brasil.
Desta forma, para a apuração dos critérios de autoria, integridade e indestrutibilidade, elementos essenciais à apuração de validade dos documentos escritos, o legislador equiparou o documento assinado por qualquer das modalidades eletrônicas àquele assinado na presença de duas testemunhas, dispensando-as, portanto.
À luz do art. 10 da MP 2200-2/2001, a firma eletrônica qualificada possui presunção relativa de autoria e pode ser utilizada para qualquer finalidade, sem possibilidade de recusa injustificada, enquanto a assinatura na modalidade simples apenas tem validade entre as partes contratantes ou terceiros que quiserem aceitá-la[2].
Em relação à autoria, é possível elencar os seguintes níveis de segurança do documento digital: Nível 1 (menos seguro) – Documento apócrifo ou com assinatura baseada em texto (ex.: e-mail); Nível 2 – Firma Eletrônica Simples; Nível 3 – Firma Eletrônica Avançada; Nível 4 – Firma Eletrônica Qualificada; Nível 5 – Instrumento Público celebrado por meio de firma eletrônica avançada; Nível 6 (mais seguro) – Instrumento Público celebrado por meio de firma eletrônica qualificada. Em relação à integridade do documento digital, é possível classificá-los da seguinte forma: Nível 1 (menos seguro) – Documento sem criptografia; Nível 2 – Documento com criptografia simétrica[3]; Nível 3 – Documento com criptografia assimétrica; Nível 4 (mais seguro) – Documento com criptografia assimétrica que adota o modelo da Infraestrutura de Chaves Públicas do Brasil (ICP-Brasil)[4].
Desta forma, considerando que os documentos digitais firmados com assinatura eletrônica, em maior ou menor grau, atestam a autoria e integridade do documento eletrônico, a tecnologia supre o papel das testemunhas para a comprovação destes fatos, atribuindo ao título natureza executiva.
O escritório Inglez, Werneck, Ramos, Cury e Françolin Advogados possui vasta experiência no assessoramento e atuação em ações de execução de título extrajudicial e demandas cogentes, colocando-se à disposição para prestar esclarecimentos complementares acerca do assunto.
[1] REsp n. 1.495.920/DF, relator Ministro Paulo de Tarso Sanseverino, Terceira Turma, julgado em 15/5/2018, DJe de 7/6/2018.
[2] CHIAVASSA, Marcelo de Mello Paula Lima; TEIXEIRA, Milena Gomes Francisco. O Impacto das Novas Tecnologias do Direito Probatório: um olhar sobre os documentos eletrônicos digitais. Revista de Processo, vol. 339/2023, pp. 353/380, maio/2023, DTR\2023\3920.
[3] A criptografia assimétrica é baseada no modelo de duas chaves distintas: uma privada (certificado digital) e outra pública (disponível para todos) correspondente, no qual o documento só poderá ser aberto pela chave pública de seu signatário se assinado com a chave privada do mesmo (MENKE, Fabiano. Assinaturas digitais, certificados digitais, infra-estrutura de chaves públicas brasileiras e a ICP alemã. Doutrinas Essenciais de Responsabilidade Civil, v. 8, p. 1169-1180, out. 2011).
[4] CHIAVASSA, Marcelo de Mello Paula Lima; ANDRADE, Vitor Morais de. Manual de direito digital. São Paulo: Tirant Lo Blanch, 2020, p. 132.